Os descontos na remuneração do servidor público podem decorrer de lei, quando independem de concordância deste, ou de sua autorização expressa.
São exemplos da primeira hipótese:
(a) recolhimento da previdência social;
(b) imposto de renda retido na fonte;
(c) faltas injustificadas;
(d) pensão alimentícia.
No segundo grupo encontram-se descontos como plano de saúde e odontológico, empréstimo consignado, vale-transporte, vale-alimentação, dentre outros.
Os Estatutos funcionais costumam prever regras para o desconto decorrente de recebimento de valores a maior da Administração. É o que preconiza, no âmbito federal, o art. 46 da Lei 8.112/90:
“Art. 46. As reposições e indenizações ao erário, atualizadas até 30 de junho de 1994, serão previamente comunicadas ao servidor ativo, aposentado ou ao pensionista, para pagamento, no prazo máximo de trinta dias, podendo ser parceladas, a pedido do interessado. (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 4.9.2001)
§ 1o O valor de cada parcela não poderá ser inferior ao correspondente a dez por cento da remuneração, provento ou pensão. (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 4.9.2001)
§ 2o Quando o pagamento indevido houver ocorrido no mês anterior ao do processamento da folha, a reposição será feita imediatamente, em uma única parcela. (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 4.9.2001)
§ 3o Na hipótese de valores recebidos em decorrência de cumprimento a decisão liminar, a tutela antecipada ou a sentença que venha a ser revogada ou rescindida, serão eles atualizados até a data da reposição. (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 4.9.2001)”
No entanto, o desconto incidente sobre os vencimentos do servidor ativo, aposentado ou pensionista deve ser previamente comunicado ao interessado, podendo ser parcelado no interesse do devedor.
Aliás, tal interpretação é expressamente reconhecida por nossos tribunais, valendo conferir, a propósito, o seguinte julgamento do STJ: “Para o servidor ativo, o aposentado e o pensionista, porém, a norma estabelece a possibilidade do desconto na remuneração, provento ou pensão, mediante prévia comunicação, admitido o parcelamento no interesse do devedor. Deve-se priorizar essa solução, porque é menos onerosa” (STJ, REsp 1.690.931/SC, 2ª T., rel. Min. Og Fernandes, j. 06.09.2018, DJe 14.09.2018).
Nesse caso a Administração não tem direito de inscrever o valor devido em dívida ativa e proceder a execução fiscal, na medida em que a referida medida se revela mais gravosa do que o desconto mensal autorizado por lei (STJ, REsp 987.291/SP, 1ª T., rel. Min. José Delgado, j. 22.04.2008, DJe 21.05.2008).
Diversa, entretanto, é a situação do servidor em débito com o erário que for demitido, exonerado ou que tiver sua aposentadoria ou disponibilidade cassada, que terá o prazo de 60 dias para efetuar o pagamento do débito, sob pena de inscrição em dívida ativa (art. 47 da Lei 8.112/90).
Ainda sobre o tema, é importante lembrar o entendimento segundo o qual o servidor público não é obrigado a restituir valores recebidos de boa-fé em razão de interpretação equivocada da Administração Pública, tal como reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça:
“ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. ART. 46, CAPUT, DA LEI N. 8.112/90 VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE POR INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA DE LEI. IMPOSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO. BOA-FÉ DO ADMINISTRADO. RECURSO SUBMETIDO AO REGIME PREVISTO NO ARTIGO 543-C DO CPC. 1. A discussão dos autos visa definir a possibilidade de devolução ao erário dos valores recebidos de boa-fé pelo servidor público, quando pagos indevidamente pela Administração Pública, em função de interpretação equivocada de lei. 2. O art. 46, caput, da Lei n. 8.112/90 deve ser interpretado com alguns temperamentos, mormente em decorrência de princípios gerais do direito, como a boafé. 3. Com base nisso, quando a Administração Pública interpreta erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos mesmos, ante a boa-fé do servidor público. 4. Recurso afetado à Seção, por ser representativo de controvérsia, submetido a regime do artigo 543-C do CPC e da Resolução 8/STJ. 5. Recurso especial não provido”. (STJ, REsp 1.244.182/PB, 1ª Seção, rel. Min. Benedito Gonçalves, j. 10.10.2012).
O Tribunal de Justiça de São Paulo, da mesma forma, já reconheceu como indevidos descontos nos proventos de aposentadoria em razão de pagamento indevido por erro da própria Administração. No caso, o Tribunal considerou inexiste má-fé do agente público aposentado, “[…] porquanto irrazoável exigir conhecimento de que o pagamento do abono de permanência não era devido desde dezembro de 2010, mas somente a partir de maio de 2011, tampouco há indícios de que tenha o funcionário de alguma forma contribuído para o equívoco da administração” (Apelação Cível n° 1001666-23.2020.8.26.0453, 12ª Câmara de Direito Público, rel. Des. Souza Meirelles, j. 29.10.2021).
Enfim, os descontos na remuneração do servidor, quando não decorram de determinação legal, dependem da concordância deste.
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